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Luís de Camões

Luís Vaz de Camões (1524-1580) foi um poeta português, considerado o maior poeta de língua portuguesa. Autor dos Lusíadas, maior obra literária portuguesa.

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Amor é fogo que arde sem se ver; É ferida que dói, e não se sente; É um contentamento descontente; É dor que desatina sem doer. É um não querer mais que bem querer; É um andar solitário entre a gente; É nunca contentar-se de contente; É um cuidar que se ganha em se perder. É querer estar preso por vontade; É servir a quem vence, o vencedor; É ter com quem nos mata, lealdade. Mas como causar pode seu favor Nos corações humanos amizade, Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

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Quando da bela vista e doce riso Tomando estão meus olhos mantimento, Tão enlevado sinto o pensamento, Que me faz ver na terra o Paraíso. Tanto do bem humano estou diviso, Que qualquer outro bem julgo por vento; Assi[m] que, em caso tal, segundo sento, Assaz de pouco faz quem perde o siso. Em vos louvar, Senhora, não me fundo, Porque quem vossas cousas claro sente, Sentirá que não pode conhecê-las. Que de tanta estranheza sois ao mundo, Que não é de estranhar, Dama excelente, Que quem vos fez fizesse céu e estrelas.

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O fogo que na branda cera ardia O fogo que na branda cera ardia, Vendo o rosto gentil que na alma vejo. Se acendeu de outro fogo do desejo, Por alcançar a luz que vence o dia. Como de dois ardores se incendia, Da grande impaciência fez despejo, E, remetendo com furor sobejo, Vos foi beijar na parte onde se via. Ditosa aquela flama, que se atreve Apagar seus ardores e tormentos Na vista do que o mundo tremer deve! Namoram-se, Senhora, os Elementos De vós, e queima o fogo aquela nave Que queima corações e pensamentos.

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Amor, com a esperança já perdida o teu sagrado templo visitei; por sinal do naufrágio que passei, em lugar dos vestidos, pus a vida. Que queres mais de mi, que destruída me tens a glória toda que alcancei? Não cures de forçar-me, que não sei tornar a entrar onde não há saída. Vês aqui a alma, a vida e a esperança, despojos doces do meu bem passado, emquanto quis aquela que eu adoro. Neles podes tomar de mi vingança: e, se ainda não estás de mi vingado, contenta-te com as lágrimas que choro.

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Amor, que o gesto humano n'alma escreve, Vivas faíscas me mostrou um dia, Donde um puro cristal se derretia Por entre vivas rosas e alva neve. A vista, que em si mesma não se atreve, Por se certificar do que ali via, Foi convertida em fonte, que fazia A dor ao sofrimento doce e leve. Jura Amor que brandura de vontade Causa o primeiro efeito; o pensamento Endoudece, se cuida que é verdade. Olhai como Amor gera, num momento De lágrimas de honesta piedade, Lágrimas de imortal contentamento.

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Quem diz que Amor é falso ou enganoso, ligeiro, ingrato, vão, desconhecido, sem falta lhe terá bem merecido que lhe seja cruel ou rigoroso. Amor é brando, é doce e é piedoso. Quem o contrário diz não seja crido; seja por cego e apaixonado tido, e aos homens, e inda aos deuses, odioso. Se males faz Amor, em mi se vêem; em mim mostrando todo o seu rigor, ao mundo quis mostrar quanto podia. Mas todas suas iras são de Amor; todos os seus males são um bem, que eu por todo outro bem não trocaria.

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Busque Amor novas artes, novo engenho, para matar me, e novas esquivanças; que não pode tirar me as esperanças, que mal me tirará o que eu não tenho. Olhai de que esperanças me mantenho! Vede que perigosas seguranças! Que não temo contrastes nem mudanças, andando em bravo mar, perdido o lenho. Mas, conquanto não pode haver desgosto onde esperança falta, lá me esconde Amor um mal, que mata e não se vê. Que dias há que n'alma me tem posto um não sei quê, que nasce não sei onde, vem não sei como, e dói não sei porquê.

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Quem vê, Senhora, claro e manifesto O lindo ser de vossos olhos belos, Se não perder a vista só em vê-los, Já não paga o que deve a vosso gesto. Este me parecia preço honesto; Mas eu, por de vantagem merecê-los, Dei mais a vida e alma por querê-los, Donde já não me fica mais de resto. Assim que a vida e alma e esperança, E tudo quanto tenho, tudo é vosso, E o proveito disso eu só o levo. Porque é tamanha bem-aventurança O dar-vos quanto tenho e quanto posso, Que, quanto mais vos pago, mais vos devo.

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